13.1.07

Identidades vazias. Uma análise crítica da Internet feita por Slavoj Zizek

7/1/2007


Eleger a internet como exemplo democrático é esconder diferenças sociais, institucionais e psicológicas entre as vidas "real" e "virtual" afirma Slavoj Zizek, filósofo esloveno em artigo publicado hoje, 7-1-2007, no jornal Folha de S. Paulo. Ele escreve que "da mesma maneira que o café descafeinado tem cheiro e gosto semelhantes aos do café sem ser café, minha persona na rede, o "você" que vejo lá, é sempre um "eu" descafeinado. Por outro lado, existe também o excesso oposto, e muito mais perturbador: o excedente de minha persona virtual com relação ao meu "eu" real".


Eis o artigo.


"Na edição de 25 de dezembro da revista "Time", o prêmio tradicional de "Pessoa do Ano" não foi concedido a Mahmoud Ahmadinejad [presidente do Irã], Kim Jong-Il [ditador norte-coreano], Hugo Chávez [presidente venezuelano] ou qualquer outro membro da gangue dos usuais suspeitos, mas a "você": a todos e a cada um de nós... usuários e criadores de conteúdo na web. A capa mostra um teclado branco com um espelho para uma tela de computador onde cada um de nós, leitores, pode ver seu reflexo. Para justificar a escolha, os editores mencionaram a transição das instituições para os indivíduos, que estão ressurgindo como cidadãos da nova democracia digital.


Há coisas que os olhos não conseguem ver, nessa escolha, e em um sentido mais amplo do que o comum nessa expressão. Se algum dia já houve uma escolha ideológica, esse é um caso que merece perfeitamente a classificação: a mensagem -uma nova democracia cibernética na qual milhões podem se comunicar e organizar diretamente, contornando o controle estatal centralizado- encobre uma série de brechas e tensões perturbadoras.


A primeira e mais evidente das ironias é que cada pessoa que olhe a capa da "Time" não verá as demais pessoas com quem supostamente se relaciona diretamente, e sim um reflexo de sua própria imagem. Não admira que Leibniz [1646-1716] seja uma das referências filosóficas preferenciais dos teóricos do ciberespaço: afinal, a imersão das pessoas no ciberespaço não se enquadra perfeitamente à nossa redução a uma mônada leibniziana que, embora "sem janelas" capazes de se abrir diretamente para as realidades externas, espelha em si mesma todo o universo?



Será que o típico internauta atual, sentado sozinho diante da tela de seu computador, não representa mais e mais uma mônada sem janelas diretas para a realidade, envolvido apenas com simulacros virtuais, e no entanto mais e mais imerso na rede mundial, e se comunicando de maneira sincrônica com todo o planeta?


Uma das mais recentes modas entre os radicais do sexo são as maratonas de masturbação, eventos coletivos nos quais centenas de homens e mulheres se autopropiciam satisfação sexual para fins de caridade. A masturbação cria uma coletividade a partir de indivíduos dispostos a compartilhar uns com os outros... o quê?


O solipsismo de uma diversão estúpida. Seria possível propor que as maratonas de masturbação são a forma de sexualidade que se enquadra de maneira mais perfeita às coordenadas do ciberespaço. Mas isso é apenas uma parte da história. O que se torna preciso acrescentar é que o "você" que se reconhece enquanto imagem em uma tela padece de uma profunda divisão: eu jamais me limito a ser a persona que assumo na máquina. Primeiro, existe o (bastante evidente) excesso do eu como pessoa corpórea "real" além da persona virtual.


Ética virtual
Os marxistas e outros pensadores de inclinações críticas gostam de apontar para o fato de que a igualdade do ciberespaço é enganosa -ela ignora todas as complexas disposições materiais (meu patrimônio, minha posição social, meu poder ou falta dele etc.). A inércia da vida real desaparece magicamente na navegação pelo ciberespaço, desprovida de fricção.


No mercado atual, encontramos toda uma série de produtos privados de suas propriedades malignas: café sem cafeína, creme sem gordura, cerveja sem álcool... ciberespaço. A realidade virtual simplesmente generaliza esse procedimento: cria uma realidade privada de substância. Da mesma maneira que o café descafeinado tem cheiro e gosto semelhantes aos do café sem ser café, minha persona na rede, o "você" que vejo lá, é sempre um "eu" descafeinado.


Por outro lado, existe também o excesso oposto, e muito mais perturbador: o excedente de minha persona virtual com relação ao meu "eu" real. Nossa identidade social, a pessoa que presumimos ser em nosso intercurso social, já é uma máscara, já envolve a repressão de nossos impulsos inadmissíveis, e é precisamente nessas condições de "só uma brincadeira", quando as regras que regulam os intercâmbios de nossas vidas reais estão temporariamente suspensas, que podemos nos permitir a exibição dessas atitudes reprimidas.


Basta lembrar do mitológico sujeito tímido e impotente que, participando de um jogo virtual interativo, adota a identidade de um assassino sádico e sedutor irresistível. Seria simples demais afirmar que essa identidade é apenas um suplemento imaginário, uma fuga temporária de sua impotência na vida real. Na verdade, o que importa é que, porque ele sabe que o jogo virtual é "apenas um jogo", ele se sente capaz de exibir "seu eu real", fazer coisas que nunca fez em interações reais -sob a capa de uma ficção, a verdade sobre ele se articula.


O fato mesmo de que eu perceba minha auto-imagem virtual como simples brincadeira me permite, assim, suspender os obstáculos que usualmente impedem que eu realize meu "lado escuro" na vida real -meu "id eletrônico" ganha asas, dessa forma. E o mesmo se aplica aos meus parceiros na comunicação via ciberespaço. Não há como ter certeza de quem sejam, de que sejam "realmente" como se descrevem, ou de saber se existe uma pessoa "real" por trás da persona on-line. A persona on-line é uma máscara para uma multiplicidade de pessoas? A pessoa "real" com quem converso possui e manipula mais personas no computador, ou estou simplesmente me relacionando com uma entidade digitalizada que não representa pessoa "real" alguma?


Existência sublimada
Para resumir, "interface" quer dizer exatamente que minha relação com o outro nunca acontece face a face, que sempre há a mediação de uma maquinaria digital interposta cuja estrutura é labiríntica: eu "navego", eu me perco sem muito rumo nesse espaço infinito onde mensagens circulam livremente sem destino fixo, enquanto seu Todo -esse imenso circuito de murmúrios- continua para sempre além do escopo de minha compreensão. O obverso da democracia direta do ciberespaço é essa caótica e impenetrável magnitude de mensagens e seus circuitos, que nem mesmo o maior esforço de minha imaginação é capaz de compreender -o filósofo Immanuel Kant [1724-1804] teria classificado o ciberespaço como "sublime".

Pouco mais de uma década atrás, havia um brilhante comercial inglês de cerveja. A primeira parte reproduzia a conhecida história de uma moça que caminha ao longo de um riacho, vê um sapo, o toma nas mãos e beija, e o sapo miraculosamente se transforma em príncipe. Mas a história não acabava assim. O jovem olhava a moça de um jeito cobiçoso, a tomava nos braços, a beijava e ela se transformava em uma garrafa de cerveja, que ele exibia em um gesto triunfante.


Assombração na rede
A moça fantasiava sobre um sapo que na verdade era príncipe, o rapaz sobre uma moça que na verdade era uma garrafa de cerveja: para a mulher, seu amor e afeto (sinalizado pelo beijo) poderiam fazer de um sapo um príncipe, enquanto para o homem, tudo não passa de um esforço para reduzir a mulher ao que os psicanalistas designam como "objeto parcial" -aquilo que, em você, me faz desejar você (é claro que um argumento feminista óbvio seria que as mulheres, em sua experiência amorosa cotidiana, em geral experimentam a passagem oposta: beijam um belo jovem e, quando o vêem de perto, ou seja, tarde demais, descobrem que ele é um sapo...).


O casal real de homem e mulher, portanto, vive assombrado por essa bizarra figura de um sapo abraçando uma garrafa de cerveja. O que a arte moderna propicia é exatamente esse espectro subjacente. É perfeitamente possível imaginar um quadro do pintor surrealista Magritte no qual um sapo abraça uma garrafa de cerveja, com um título como "Homem e Mulher" ou "Casal Ideal" (a associação com a famosa cena surrealista do burro morto ao piano [do filme "O Cão Andaluz"] fica completamente justificada, nesse caso).


É essa a ameaça do ciberespaço e de seus jogos, no plano mais elementar: quando um homem e uma mulher interagem nele, podem se ver assombrados pelo espectro do sapo que abraça a cerveja. Já que nenhum dos dois está consciente disso, as discrepâncias entre o que "você" realmente é e o que "você" aparenta ser no espaço digital podem resultar em violência homicida."


Fonte aqui

10.1.07

MTV recebe mais de 20 mil e-mails contra bloqueio do YouTube

09/01/2007 - 16h01
MTV recebe mais de 20 mil e-mails contra bloqueio do YouTube
Da Redação

O bloqueio ao site YouTube provocou uma onda de protestos. O site começou a ser bloqueado nesta segunda-feira por empresas de telefonia após decisão judicial em favor do namorado da modelo Daniela Cicarelli, Tato Malzoni. Ele quer impedir a exibição de imagens gravadas em uma praia da Espanha em que os dois aparecem em cenas íntimas.


Ao menos 5,7 milhões de internautas, usuários da Brasil Telecom, ficaram sem conseguir acessar o domínio www.youtube.com até a tarde desta terça-feira, quando o acesso foi liberado. A Telefonica também chegou a implementar o bloqueio, mas não divulgou o número de internautas afetados.

Zico Goes, diretor de programação da MTV, diz que já recebeu mais de 20 mil e-mails de protesto. "Obviamente não temos nada a ver com a história, a Daniela também não tem. Quem processou o YouTube foi o Renato Malzoni Filho, não ela", afirmou.

Brasileiros criaram o site www.boicoteacicarelli.com, em que apregoam o boicote à modelo e à rede de televisão MTV. "Eu já deletei o canal da minha TV, não assisto MTV até a Cicarelli sair do ar", dizia o internauta Caio no site. Há até vídeos que explicam como desprogramar o canal da televisão.

"A MTV se posiciona contra toda a censura e pela liberdade da expressão. Claro, a garotada ficou indignada. Mas repudiamos a história do boicote, porque ela flerta com o mesmo espírito fascista que quer atacar", diz o diretor da MTV.

O diretor teatral Gerald Thomas, que vive em Nova York, adotou recentemente o site de compartilhamento de vídeos YouTube para mostrar aos amigos no Brasil trechos de suas peças. Nesta segunda (08/01), quem acessou seu blog não conseguiu ver as cenas do novo espetáculo "Earth in Trance". "Não dá mais para ver o vídeo", dizia um visitante.

"Voltamos à era da censura?", questionou Thomas, irritado. "O passo seguinte é banir a Internet inteira, porque vídeos circulam pela rede mesmo antes do YouTube existir: tem que banir a imprensa também e qualquer fotografia."


Fúria virtual
Entre os comentários exaltados e dicas para burlar o bloqueio, um blog chegou a publicar um modelo de ação de indenização contra os provedores de acesso, por barrarem o acesso ao site de vídeos.

Mas isso não funcionaria, explica o especialista em direito eletrônico Renato Opice Blum. "O provedor não tem responsabilidade nenhuma, está só cumprindo uma ordem judicial", disse.

Segundo ele, uma alternativa mais rápida, menos polêmica e tecnicamente viável para o caso seria ter identificado quem está colocando o vídeo no ar e reprimido um a um, como fazem as gravadoras norte-americanas em relação aos piratas de MP3. "Acaba sendo uma divulgação do que pode e do que não pode, e ajuda a evitar a disseminação [do vídeo] por outros meios", afirmou Blum.

Reponsabilidade de quem?
No rastro da controvérsia ainda há a responsabilidade técnica pelo bloqueio, já que as operadoras de tráfego não têm como impedir o acesso a um único vídeo.

"Basta você entrar no YouTube hoje. O mesmo vídeo é apresentado de maneiras diferentes, com logotipos e edições diferentes. Mesmo que você faça análises com ferramentas de software para reconhecer o vídeo, não é possível capturá-lo", explica Carlos Afonso, do Comitê Gestor da Internet. "Se você entrar no sistema de troca de arquivos BitTorrent, então, há milhares de cópias. Quanto mais houver processos, mais o vídeo vai se disseminar."

Fóruns, blogs e comunidades virtuais parecem confirmar o que diz Afonso. Estão repletos de indicações de métodos para burlar o bloqueio ao YouTube, e também de links alternativos para assistir ao vídeo.

Na decisão por suspender o bloqueio, o desembargador Ênio Santarelli Zuliani pede que as operadoras de backbone informem ao Tribunal de Justiça de São Paulo as razões técnicas da impossibilidade de bloquear apenas o vídeo.

Protestos e censura
Para Márion Strecker, diretora de conteúdo do UOL, proibir o grande público de ter acesso a todo um portal por causa de um só vídeo foi uma medida extrema. "Decisões judiciais precisam ser acatadas, mas o UOL defende a livre circulação da informação e é totalmente contra a censura. O fato é que a Internet trouxe à sociedade as ferramentas para facilitar a publicação e a circulação livre da informação. O autor de um vídeo pode publicá-lo em muitos sites ou portais diferentes, em regiões e países diferentes", diz Strecker.

O tema também gerou polêmica na blogosfera. No site Technorati, buscador de blogs, o termo "Daniela Cicarelli" era o segundo mais procurado em blogs de todo o mundo desde domingo. Só perdia para "Saddam". O termo YouTube aparecia na quinta posição, e "Cicarelli" também estava em sexto lugar.

Outro blogueiro indignado com o bloqueio foi Marcelo Tas. Para ele, a ação judicial equivaleu a tirar uma revista de circulação devido à publicação de uma foto indevida. "Uma coisa é você processar um veículo que divulgue algo difamando você, e processar a pessoa que criou a difamação. Isso é legítimo. Outra coisa é você cercear a liberdade de expressão, e o sinônimo disso é censura", disse Tas.

Também circulou pela Internet um abaixo-assinado, no site www.petitiononline.com/brtube/petition.html, pedindo a intervenção do governo, com cerca de 7.500 assinaturas até o início desta terça-feira, quando foi suspenso o bloqueio. Comunidades no Orkut discutem a medida, e internautas exaltados também classificam de censura o impedimento de acessar o site.

Já Demi Getschko, do Comitê Gestor da Internet no Brasil, acha exagerado falar em censura. "Na China [onde há censura da Internet], o bloqueio não é feito pelo Judiciário, mas pelo Executivo", diz. "Acredito não ter sido intenção do magistrado causar dano aos usuários brasileiros. Ele tentou fazer cumprir uma decisão, mas usou uma solução que extrapolou o objetivo e causou repercussão gigantesca."

O bloqueio
O bloqueio ao YouTube no Brasil cumpriu decisão liminar após ação movida por Renato Malzoni Filho, devido à publicação de um vídeo com cenas íntimas dele e sua namorada, Daniela Cicarelli. As cenas foram filmadas em Cádiz, na Espanha, no ano passado.

Na semana passada, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concedeu liminar em favor de Cicarelli, ex-mulher do jogador de futebol Ronaldo, e de Malzoni.

Nesta segunda-feira, a Brasil Telecom disse ter recebido ofício da Justiça e foi a primeira a informar que tinha bloqueado o acesso de internautas brasileiros ao YouTube, uma unidade do mecanismo de buscas norte-americano Google.

A Telefonica emitiu comunicado afirmando que "todas as empresas que possuem controle de tráfego de dados internacional" foram notificadas e que a determinação de bloquear o acesso ao YouTube no Brasil é "válida por tempo indeterminado". A empresa também confirmou o bloqueio no final de segunda-feira.

No início da tarde desta terça-feira (09/01), despacho do desembargador Ênio Santarelli Zuliani suspendeu o bloqueio ao YouTube. O próximo passo seria a Justiça notificar as operadoras dessa suspensão. O vídeo do casal, no entanto, continua proibido e as operadoras de tráfego da Internet deverão informar à Justiça as dificuldades em bloqueá-lo.

Com Reuters

Fonte aqui

Desembargador do TJ-SP manda desbloquear YouTube

Ou seja
Desembargador do TJ-SP manda desbloquear YouTube


por Maurício Cardoso

O desembargador Ênio Santarelli Zuliani, do Tribunal de Justiça de São Paulo, determinou nesta terça-feira (9/1) o desbloqueio do site de vídeos YouTube. Ele mandou "restabelecer o sinal do site YouTube, solicitando que as operadoras restabeleçam o acesso e informem ao Tribunal as razões técnicas da suposta impossibilidade de serem bloqueados os endereços eletrônicos".

No despacho, o desembargador explica sua decisão que acabou tirando do ar o site de vídeos YouTube. Segundo Zuliani, a decisão foi motivada pela negativa do site em cumprir uma decisão judicial e que só foi aplicada por uma suposta dificuldade em bloquear apenas o acesso ao vídeo das cenas de namoro na praia da modelo Daniela Cicarelli.

Zuliani sustenta mais uma vez, como já havia feito anteriormente em entrevistas à imprensa, que ordenou apenas que fossem tomadas “providências que impeçam o acesso dos internautas brasileiros ao vídeo das filmagens dos autores da ação”. E acrescenta em outro item de seu despacho: “Todavia, é forçoso reconhecer que não foi determinado o bloqueio do sinal do site YouTube”.

O desembargador afirma que tomou conhecimento que as operadoras de conexão internacional à internet bloquearam o acesso ao site do YouTube e não ao vídeo de Cicarelli, mas que isso se deve a dificuldades técnicas de bloquear apenas o vídeo.

Das cinco empresas que operam os troncos de conexão internacional (backbone), a Brasil Telecom e a Telefônica já foram notificadas judicialmente e chegaram a bloquear o acesso ao site.

Leia o despacho

AGRV.Nº: 488.184-4/3

Relator Des. ÊNIO SANTARELLI ZULIANI (4ª Câmara Direito Privado)

COMARCA: SÃO PAULO

AGTE. : RENATO AUFIERO MALZONI FILHO

AGDO. : YOUTUBE INC.

Vistos.

1. Tomei conhecimento do bloqueio do site Yotube, para cumprir decisão de minha autoria.

Observo que realmente concedi efeito ativo ao agravo interposto por Renato Aufiero Malzoni Filho, no sentido de serem adotadas providências que impeçam o acesso dos internautas brasileiros ao vídeo das filmagens dos autores da ação [Renato e Daniella Cicarelli Lemos] na praia de Cádiz, na Espanha.

Tal determinação decorre do poder concedido ao juiz para empregar meios de coerção indiretos [art. 461, § 5º, do CPC] no sentido de obter efetivo cumprimento das decisões judiciais. No caso, há um Acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo [AgIn. 472.738-4], deferindo tutela antecipada para interditar toda e qualquer atividade, da internet, de exploração da imagem dos autores, por evidenciar ofensa aos direitos da personalidade.

2. É preciso dispor que a questão não diz respeito mais ao vídeo de Cicarelli, como ficou conhecida a matéria, porque o que está em análise é a respeitabilidade de uma decisão judicial. O Youtube não cumpre a sentença, o que constitui ofensa ao art. 5º, XXXV, da CF, uma ameaça ao sistema jurídico. As sentenças são emitidas para serem executadas.

3. O bloqueio do site está gerando uma série de comentários, o que é natural em virtude de ser uma questão pioneira, sem apoio legislativo. O incidente serviu para confirmar que a Justiça poderá determinar medidas restritivas, com sucesso, contra as empresas, nacionais e estrangeiras, que desrespeitarem as decisões judiciais. Nesse contexto, o resultado foi positivo.

4. Todavia, é forçoso reconhecer que não foi determinado o bloqueio do sinal do site Yotube. Essa determinação, que é possível de ser tomada em caráter preventivo, como esclarece o jurista português JÓNATAS E. M. MACHADO [Liberdade de expressão: dimensões constitucionais da esfera pública no sistema privado, Universidade de Coimbra, 2002, p. 1123], deve ser emitida com clara fundamentação e com total transparência sobre o direito de liberdade de expressão e informação, que não comporta censura [art. 220, § 1º, da CF]. Impedir divulgação de notícias falsas, injuriosas ou difamatórias, não constitui censura judicial. Porém, a interdição de um site pode estimular especulações nesse sentido, diante do princípio da proporcionalidade, ou seja, a razoabilidade de interditar um site, com milhares de utilidades e de acesso de milhões de pessoas, em virtude de um vídeo de um casal.

5. O relator agradece o empenho com que as operadoras agiram quando receberam os ofícios do Juízo de Primeiro Grau, para que fosse cumprida a decisão. Acredita-se que o fechamento completo do sinal de acesso ocorreu por dificuldades técnicas de ser criado o filtro que impeça o acesso ao vídeo do casal. Mas, não foi essa a determinação, pois o que se ordenou foi o emprego de mecanismo que bloqueasse o acesso a endereços eletrônicos que divulgam o vídeo, cuja proibição foi determinada por decisão judicial. Não há, inclusive, referência para corte do sinal na hipótese de ser inviável a providência determinada.

6. Para que ocorra execução sem equívocos, determina o relator que se expeça ofício ao digno Juízo para que mande restabelecer o sinal do site Yotube, solicitando que as operadoras restabeleçam o acesso e informem ao Tribunal as razões técnicas da suposta impossibilidade de serem bloqueados os endereços eletrônicos.

7. Fica registrado não estar excluída a imposição, pela Turma Julgadora, de medidas drásticas, como o bloqueio preventivo, por trinta dias ou mais, até que o Yotube providêncie a instalação de software, com poder moderador das imagens cuja divulgação foi proibida. Porém, essa é uma decisão de competência da Turma Julgadora e que poderá ser tomada na próxima sessão de conferência de votos dos Desembargadores. Ademais, a decisão definitiva dependerá das respostas técnicas das operadores que foram notificadas.

8. Oficie-se com urgência para que o Juízo transmita a contra-ordem, por sistema rápido de comunicação, de forma a concretizar o desbloqueio do site Yotube, mantida a determinação para que se tomem providências no sentido de bloquear o acesso ao vídeo de filmagens do casal, desde que seja possível, na área técnica, sem que ocorra interdição do site completo.

Intimem-se.

São Paulo, 9 de janeiro de 2007.

ÊNIO SANTARELLI ZULIANI

Relator

Revista Consultor Jurídico, 9 de janeiro de 2007

Fonte aqui

Censura cega

Desembargador paulista censura YouTube sem querer
por Priscyla Costa e Aline Pinheiro

O Brasil ganhou os holofotes da imprensa mundial no último final de semana. O motivo foi a determinação judicial para bloquear o acesso dos internautas brasileiros ao site YouTube, um canal da internet especializado em divulgar vídeos. A punição foi provocada pela suposta recusa do site em tirar do ar o vídeo que exibe cenas de ardente paixão da modelo Daniela Cicarelli e do empresário Renato Malzoni Filho, namorando numa praia espanhola.

A interdição do acesso à internet coloca o Brasil na companhia de países como China, Cuba e Irã, que não se destacam pelo apreço à democracia e à liberdade de imprensa. A maneira confusa como se formalizou a proibição revela a falta de entendimento da Justiça para atuar em questões que envolvam novidades tecnológicas como a internet.

A situação mostra ainda a inutilidade de se tentar impor medidas unilaterais de controle sobre a internet, que tem como uma de suas características fundamentais a falta de controles. A proibição de acesso ao YouTube, onde por sinal o vídeo já não se acha mais em exibição, não impediu que quem quisesse pudesse ver as cenas picantes de sexo implícito do casal nas centenas de outros sites que replicaram a peça.

Outra questão é a da territorialidade. Como a Justiça brasileira vai alcançar e impor suas decisões a sites da internet que podem ser acessados por brasileiros mas cuja administração está baseada em outros países. A única maneira de se obter algum sucesso é mediante a negociação.

Em nota enviada ao jornal O Globo, porta-vozes do YouTube esclareceram que o portal, criado por americanos, está subordinado às leis dos Estados Unidos. Como tem audiência-global, “se esforça para manter uma comunidade em que pessoas de todo mundo possam compartilhar vídeos de forma segura, dentro da lei”. O portal já bloqueou em seus servidores o acesso ao vídeo, mas o filme erótico ainda pode ser visto em blogs e sites de troca de dados.

O YouTube, que recentemente foi adquirido pela Google Inc., dona da mais importante ferramenta de busca na internet, bem que tentou atender à determinação da Justiça brasileira. No momento em que esta reportagem era escrita, o vídeo famoso estava fora da programação do YouTube. Mas no momento em que este texto estiver sendo lido, já poderá estar de volta.

Isto porque o sucesso do site está justamente na fórmula que permite a qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo divulgar na internet o seu próprio vídeo. O site tem uma política de privacidade que proíbe a publicação de material com conteúdo ofensivos de modo geral e exerce uma vigilância para eliminar material impróprio. O que permite um controle apenas relativo, já que a observância estrita da regra de bom comportamento depende de cada um dos seus usuários.

Confusão em cadeia

A ordem de bloqueio do site partiu do desembargador Ênio Santarelli Zuliani, da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. Na quarta-feira (3/1), o desembargador concedeu a liminar porque o site não teria atendido decisão anterior do próprio TJ paulista, que determinava que o vídeo de Cicarelli fosse retirado do ar.

O que está escrito na decisão do desembargador, no entanto, é diferente do que ele quis dizer. Zuliani, por meio da assessoria de imprensa do TJ, explicou que determinou tão somente o bloqueio do acesso ao vídeo de Cicarelli, e não ao conteúdo de todo o site. Mas, no papel, ele vetou o acesso ao site. E como o que prevalece é a decisão nos autos, a Brasil Telecom e a Telefônica já foram notificadas. A primeira já bloqueou o acesso ao YouTube e a Telefônica, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que está tomando as providências para bloquear o acesso ao site.

Para tomar sua decisão, o desembargador fez uma consulta a especialistas em internet. O perito Paulo César Breim, autor de um dos laudos que fundamenta a decisão, explica que as medidas apontadas por ele são mesmo para tirar o site do ar. “É possível bloquear o acesso apenas ao vídeo, tarefa mais complicada. Mas não foi isso que foi pedido”, diz. O desembargador sustenta que sua intenção era de bloquear apenas o vídeo, mas em sua decisão deu ordens para bloquear todo o site.

Para que o bloqueio total do YouTube se compete, a ordem judicial deverá ser apresentada às cinco operadoras dos troncos de conexão com a rede mundial de computadores no Brasil, os chamados backbone. Além da Brasil Telecom e da Telefônica, também fazem essa ligação a Telecom Itália, a Embratel e a Global Crossing. A Telecom Italia e a Embratel não tinham sido notificadas para fazer o bloqueio até a tarde desta segunda-feira (8/1). A Global Crossing não foi encontrada pela Consultor Jurídico.

Discussão jurídica

Fora a discussão técnica sobre a possibilidade de retirar do ar parte ou todo o conteúdo de sites hospedados no exterior, a decisão do desembargador paulista também levou à discussão jurídica sobre o assunto. Para uns, a Justiça brasileira pode sim bloquear o acesso a site estrangeiro que infrinja a lei brasileira. Para outros, não.

O advogado Renato Ópice Blum faz parte da primeira corrente. Ele considera que, se houver pedido específico para o bloqueio do acesso, a Justiça pode atendê-lo. Ele explica que a Justiça brasileira também pode bloquear o acesso do site para um determinado público, desde que seja respeitado o devido processo legal. O fundamento desse entendimento, de acordo com Blum, está no artigo 461, parágrafo 5º, do Código de Processo Civil.

O dispositivo legal diz: “na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial”.

Outro artigo do CPC que pode fundamentar a decisão é o 20: “salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da Justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais”.

Para Ópice Blum, os internautas que não estiverem conseguindo acessar o site não podem alegar que estão sendo prejudicados. “A Brasil Telecom (empresa que já bloqueou o acesso ao YouTube) continua oferecendo o acesso à internet, a conexão, que é o serviço em si. E quanto ao bloqueio, há cumprimento de ordem judicial, que ainda pode ser questionada por recursos específicos.”

A advogada Patrícia Peck Pinheiro divide a mesma opinião. “A Justiça Brasileira pode determinar o bloqueio de um endereço de IP ou domínio se o registro for considerado como ilícito ou contrário às leis brasileiras. Este bloqueio pode ser feito pelo Brasil”, diz. “Neste caso, as empresas que cuidam do backbone (Brasil Telecom, Telefônica, Telecom Itália, Global Crossing e Embratel) bloqueiam o acesso em suas bases e assim os usuários não entram mais no endereço eletrônico. Esta medida tem sido solicitada especialmente no combate a ambientes de prática de crimes eletrônicos, pirataria, fraude eletrônica.”

Quanto aos usuários em geral, Patrícia Peck entende que não há dano. “O usuário não está acima da lei. Ao contrário. Cabe a empresa, no caso o YouTube, recorrer da decisão. Pode até justificar que seus usuários serão prejudicados, mas a Justiça pode entender pela proteção do bem público, em detrimento de alguns.”

Omar Kaminski, especialista em Direito da Informática, encabeça a segunda corrente, que considera abusivo o bloqueio do site. “O bloqueio desastrado feriu o direito de acesso às informações do YouTube de forma generalizada, e não resolveu o problema. São iniciativas como essas que podem acabar com a internet como conhecemos.”

No caso Cicarelli, entra em jogo a questão da liberdade de expressão em contraposição ao direito à privacidade, mas esta é outra história e que já é discutida há tempos em relação a outras formas de manifestação do pensamento como a imprensa escrita e a televisão.

De qualquer forma, continua causando espécie que por conta de um conteúdo específico — o vídeo de Cicarelli com alguns poucos minutos de duração — seja bloqueado todo um site — o YouTube com seus milhares de vídeos e sua proposta de interação ampla, geral e irrestrita. Em um dos muitos comentários postados na internet a respeito do caso envolvendo a modelo e o site de vídeos, um leitor faz a pergunta que parece mais adequada: “quem deve sair do Brasil, a Cicarelli ou o YouTube?”.

Revista Consultor Jurídico, 8 de janeiro de 2007

Fonte aqui

Censura ao You Tube - Reportagem do Jornal da Globo 09/01/07

23.12.06

Ditado popular



"Quando achamos que sabemos todas as respostas,
vem a vida e muda as perguntas."
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Tradição x inovação


"Era uma vez uma tribo pré-histórica que se alimentava de carne de tigres de dentes de sabre. A educação nesta tribo baseava-se em ensinar a caçar tigres de dentes de sabre, porque disto dependia a sobrevivência de todos. Os mais velhos eram os responsáveis pela tarefa educativa. Passado algum tempo os tigres de dentes de sabre extinguiram-se. Criou-se um impasse: o apego à tradição dos mais velhos exigia que se continuasse a ensinar a caçar tigres de dentes de sabre; os mais jovens clamavam por uma reforma no ensino. O impasse perdurou por muito tempo. Mais precisamente até um dia que, por falta de alimento, a tribo extinguiu-se também." (Fábula)


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Reflita sobre a fábula acima e faça um texto utilizando os conceitos de tradição, inovação, paradigma e senso crítico.

Sistema produtivo x senso crítico


“O sistema em que vivemos faz questão de ocupar o nosso tempo de tal maneira que acaba nos tirando a capacidade de pensar. Opinião é algo que se adquire parando e reservando um pouco de tempo para ficarmos sozinhos, para pensar e buscar o conhecimento acerca de nós mesmos”.



Mariana Rost


"Cada vez mais se torna necessário que o trabalhador tenha conhecimentos atualizados, iniciativa, flexibilidade mental, atitude crítica, competência técnica, capacidade para criar novas soluções e para lidar com a quantidade crescente de novas informações, em novos formatos de acesso".



(Livro Ciber professor, 2004)



"O indivíduo deve ser capaz de refletir sobre o escrito, permitido-se fazer uma relação entre o real, o ideal e a fantasia, tirando suas próprias conclusões, criando novos conceitos de ver e sentir a realidade".



"O gosto pela leitura e a compreensão de sua mensagem é algo muito particular de cada ser. A informação é algo importante que influenciará no modo de pensar e agir de cada indivíduo".


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Faça uma "análise comparativa" dos pensamentos acima e elabore um texto com os conceitos: informação, sistema produtivo e senso crítico.

Inclusão digital


“Não basta ter acesso à informação, é preciso saber o que fazer com ela. Desenvolver a capacidade de "aprender a aprender" não é uma tarefa fácil. Desenvolver o senso crítico da população: isso sim é democratizar a informação e concretizar a cidadania”.



Marie Anne Macadar
Leia o artigo Desmistificando a Inclusão Digital na íntegra

12.12.06

Aprendizagem, tempo, paradigmas e desvios...

O método desviante

Por Jeanne Marie Gagnebin


Algumas teses impertinentes sobre o que não fazer num curso de filosofia

Como uma boa e velha professora de filosofia, prefiro cercear o assunto, amplo demais, por caminhos negativos, desvios e atalhos que não parecem levar a lugar algum. Digo “professora de filosofia”, porque meu território de atuação é, primeiramente, a sala de aula e a dinâmica com os estudantes, com todas as vantagens e todas as restrições que o ensino universitário no Brasil traz consigo. E digo também uma “velha” professora de filosofia porque posso me permitir, hoje, nesse momento de minha carreira acadêmica, algumas provocações que não vão (pelo menos, assim o espero!) colocar em questão nem meu contrato nem meu emprego. Imagino que os jovens colegas, com ou sem vaga ainda, não ousariam pensar de tal maneira, pelo menos explicitamente, porque têm que assegurar primeiro seu lugar no sol. Ofereço a eles um pequeno descanso na sombra.

Primeira regra para o reto ensino, em particular, o reto ensino da filosofia: não temer os desvios, não temer a errância. Os programas e “cronogramas” somente servem de esboços utópicos do percurso de uma problemática. Não esquecer que o tempo é múltiplo: não é somente “chronos” (uma concepção linear que induz falsamente a uma aparência de causalidade), mas é também “aiôn” (esse tempo ligado ao eterno, que, confesso, ainda não consegui entender...) e, sobretudo, “kairos”, tempo oportuno, da ocasião que se pega ou se deixa, do não previsto e do decisivo. Quando algo acontece na aula, quando algo pode ser, subitamente, uma verdadeira questão (para todos: estudantes e professor, não só para este último), aí vale a pena demorar, parar, dar um tempo, descrever o impasse e, talvez, perceber que algo está começando a ser vislumbrado, algo que ainda não tinha sido pensado (não por ninguém na tradição filosófica inteira, isso é abstrato, mas por ninguém dos participantes concretos agora e aqui na aula), algo novo e, portanto, que não sabemos ainda como nomear.

Segunda regra para o reto ensino, já cheio de desvios: não ter medo de “perder tempo”, não querer ganhar tempo, mas reaprender a paciência. Essa atitude é naturalmente muito diferente, imagino, num ensino dito técnico, no qual os estudantes devem aprender várias técnicas, justamente, vários “conteúdos”, ensino essencial para o bom funcionamento de várias profissões. Mas, no ensino da filosofia (e talvez de mais disciplinas se ousarmos pensar melhor), paciência e lentidão são virtudes do pensar e, igualmente, táticas modestas, mas efetivas, de resistência à pressa produtivista do sistema capitalista-mercantil-concorrencial etc. etc. (esqueci de dizer que a velha professora tinha 20 anos em 1968). Lyotard disse isso lindamente: “Si l’un des principaux critères de la réalité et du réalisme est de gagner du temps, ce qui est, me semble-t-il, le cas aujourd’hui, alors le cours de philosophie n’est pas conforme à la réalité d’aujourd’hui. Nos difficultés de professeurs de philosophie tiennent essentiellement à l’exigence de la patience. Qu’on doive supporter de ne pas progresser (de façon calculable, apparente), de ne faire que commencer toujours, cela est contraire aux valeurs ambiantes de prospective, de développement, de ciblage, de performance, de vitesse, de contrat, d’exécution, de jouissance” (« Le Postmoderne Expliqué aux Enfants », Galilée, 1986, Paris, pp. 158/159). (1 - tradução no final deste texto)

Terceira regra desviante: não querer ser “atual”, estar na moda, up to date, mas assumir o anacronismo produtivo, uma não-conformidade ao tempo (Unzeitgemässheit, dizia Nietzsche), não correr atrás das novidades (mercadorias intelectuais ou não), mas perceber o surgimento do devir no passado antigo ou no presente balbuciante, hesitante, ainda indefinido e indefinível. Deixar que essa hesitação possa desabrochar. Não procurar por normas e imperativos, mesmo na desorientação angustiante, mas conseguir dizer, de maneira diferenciada, as dúvidas. (Caro leitor, você já percebeu a quantos imperativos somos submetidos, somente andando 10 km na cidade ou lendo uma revista? O tempo do imperativo é o da propaganda).

Resistir, portanto à tentação do professor e do “intelectual” em geral de ter de encontrar uma saída, uma solução, uma lei, uma verdade, um programa de partido ou não. Agüentar a angústia. Adorno dizia que essa dimensão era uma dimensão de resistência não só ao sistema dominante do mundo administrado, mas também aos sonhos de dominação do pensamento. Não querer colocar uma ordem necessária onde há primeiro, desordem, não confundir “taxinomia”, arranjo em várias gavetas com pensamento -pois pensar é, antes de mais nada, duvidar, criar caminhos, perder-se na floresta e procurar por outro caminho, talvez inventar um atalho.

Quarta regra de método desviante (“Método é desvio”, dizia um velho mestre quase chinês, Walter Benjamin): não se levar tão a sério assim, só porque estudou latim e grego ou fez doutorado na Alemanha ou consegue entender Heidegger. Mais radicalmente: não levar demais a sério as “opiniões” pessoais, em particular as suas. São, no melhor dos casos, somente a ocasião de ir além delas, do reino dito encantado das “idéias” e “crenças” subjetivas. Não cair na ilusão liberal de que a liberdade se esconde nas escolhas individuais, arbitrárias e/ou manipuladas. Se há algo que a reflexão filosófica pode realmente ajudar a pensar é a necessidade de ultrapassar, de ir além -isto é de “transcender”- os pequenos narcisismos individuais para vislumbrar “o vasto oceano da Beleza” (dizia o velho Platão), o Reino do Espírito, dizia outro velho senhor idealista, hoje talvez digamos o “enigma do Real” ou, então, as linhas de fuga e os acontecimentos.

Essa dimensão “objetiva” (não em oposição ao “sujeito”, mas levando em questão a materialidade e a historicidade das “coisas” que nos resistem e nos atraem) do pensamento justifica a exigência, imprescindível, da diferenciação conceitual, isto é, do esforço e da ascese (askesis, ou exercício, em grego) conceituais: não se trata de malabarismos intelectuais complicados, mas de tentativas sempre reiteradas de compreender o “real” sem violentá-lo. Esse esforço, essa “paciência do conceito”, vai, de novo, contra a pressa reinante, e também contra os “achismos” tão prezados na imprensa e na televisão, nos meios ditos de “comunicação”. Também resiste à ilusão de que o debate de idéias, como se diz, seja um enfrentamento de dois ou mais oradores brilhantes (ou não) que tentam, cada um, fazer prevalecer sua opinião sobre a opinião do outro.

A ascese conceitual também implica o aprendizado de um certo despojamento da vontade individual e concorrencial de auto-produção perpétua em detrimento dos outros. Não se trata de ser melhor que os outros, mas de estar atento às possibilidades de transformação da realidade, portanto, de não passar ao lado dela, de compreendê-la melhor, na sua possível mutabilidade. Isso implica, aliás, que, muitas vezes, não sei, não posso dizer nada que ajude, portanto também ouso calar-me, não cedo à tentação de falar sobre tudo e qualquer coisa.

Conclusão: não se dobrar aos imperativos mercantis-intelectuais da “produção” de “papers” e da contagem de pontos nos inúmeros “curricula” e relatórios administrativos-acadêmicos: se tiver que contar “pontos”, conte para que lhe deixem em paz, mas não confunda isso com trabalho intelectual ou mesmo espiritual. Já que temos o privilégio de lecionar filosofia, isto é, uma coisa de cuja utilidade sempre se duvidou, vamos aproveitar esse grande privilégio (de classe, de profissão, de tempo livre) e solapar alguns imperativos ditos categóricos e racionais: contra a pressa, a produtividade, a concorrência, a previsibilidade, a especialização custe o que custar, as certezas e as imposições. Podemos exercer, treinar, mesmo numa sala de aula, sim, pequenas táticas de solapamento, exercícios de invenção séria e alegre, exercícios de paciência, de lentidão, de gratuidade, de atenção, de angústia assumida, de dúvida, enfim, exercícios de solidariedade e de resistência.
(Publicado em 3/12/2006)

Jeanne Marie Gagnebin É professora de filosofia na PUC/SP e de teoria literária na Unicamp, autora, entre outros, de "História e Narração em Walter Benjamin" (Perspectiva, 1994) e de "Sete Aulas sobre Linguagem, Memória e História" (Imago, 1997).

1 - “Se um dos principais critérios da realidade e do realismo é ganhar tempo, o que é, me parece, o caso hoje em dia, então o curso de filosofia não se ajusta à realidade de hoje. Nossa dificuldade de professores de filosofia concerne essencialmente à exigência de ser paciente. Que se deva suportar não progredir (de maneira calculável, aparente), ter que começar sempre, isso é contrário aos valores dominantes de prospectiva, de desenvolvimento, de alvo, de performance, de velocidade, de contrato, de execução, de gozo.” (tradução da Redação)

Fonte:11.12.06

16.11.06

Blog de crônicas políticas

"A imprensa não deve ser justa, nem bela. Deve ser livre. Nos tempos atuais, deve ser livre para elogiar. Apenas para elogiar.
E, de preferência, elogios sóbrios. Sem piadinhas".
Rodolfo Torres
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Confira o blog de Rodolfo Torres: Blá blá blá Brasília
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Para REFLEXÃO:
Qual é a sua opinião sobre o papel da imprensa?
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6.11.06

Só não ler quem não quer...

Olá alunos,

Viva a internet! Nos dias atuais, sabemos que só não lê quem não sabe e quem não quer. Então, para estimular a leitura, selecionei uns links de acesso para livros. São várias obras de diversos autores! Além disso, têm obras em português e inglês.

Aproveitem o tempo com cultura! Afinal, ler também é viajar!
Abraços, Solange

Todos os livros estão compactados. Entre aqui no HD Virtual . Clique em uma pasta e em seguida nos arquivos de sua preferência. Será aberta uma nova página, depois de carregada, role-a até o final e procure o botão Download, clique e espere ser concluindo. As novas adições à lista, estarão marcadas com (Novo)

Veja também:Cultivox: e-livros em português

Tem mais aqui...

Em inglês:
http://promo.net/pg/
http://digital.library.upenn.edu/books/


Alguns, dos autores disponíveis:
Machado de Assis - Allan Kardec - Sigmund Freud - Carta Testamento de Getúlio - Francis Bacon - Bhaghavad Gita - Bíblia - Velho Testamento - Frederico Nietzsche - Frei Vicente do Salvador - Shakespeare - Augusto Comte - Leon Trotsky - Rainer Maria Rilke - Marco Aurélio - Pablo Neruda - Artur Rimbaud - Voltaire - Catherine Clement - Marquês de Sade - Julio Cortazar - Raul Brandão - Jorge Luis Borges - Guy de Maupassant - William Sargant - Pe. Antonio Vieira - Gregório de Matos - Lev Semenovich Vygostsky - Artur Azevedo - Álvares de Azevedo - Martins Pena - Joaquim Norberto de Souza e Silva - França Júnior - Gonçalves de Magalhães - Augusto dos Anjos - Legislação eleitoral - Franz Kafka

2.11.06

Reflexão...

"Parece que o mundo só salta quando empurrado pelos atormentados. Newton quase morreu, andava procurando um código na Bíblia, e descobriram uma porção de obras suas dedicadas à velha Alquimia. Marx quase deixou a família morrer de fome. Freud era meio pancada. Wilhelm Reich, brigou com todo mundo, fez chover no deserto com seu cloudbuster e acabou morto pela democracia americana. Jung andava as voltas com seus fantasmas... Pauling, Einstein, Darwin, Crick e uma legião de outros. Quando se olha na fileira do tempo dá prá ver uma porção deles acenando as mãos. Parece que a humanidade tem um grande débito com esses caras."

(Trecho escrito por Caio numa comunidade no orkut).

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E você o que pensa do trecho acima?

31.10.06

Refletindo sobre a situação social do país...


O Brasil é considerado um país com enorme disparidade social atribuída pela má distribuição de renda, dentre outros fatores. Com base nos textos “Transferência de renda pelo governo em 2004”, “Classe média encolheu em 2003” e “Distribuição de renda no Brasil” (ver links abaixo) e, pesquisando em outras fontes, faça uma análise crítica refletindo sobre:

1) Os programas chamados “assistenciais” podem resolver a questão das diferenças sociais no Brasil? São ações válidas? Por quê?


2) O resultado das eleições de 2006, com a reeleição do presidente Lula, pode ser atribuído aos programas de “transferência de renda”?

3) Na sua opinião quais medidas o governo deveria tomar para minimizar a pobreza no país?

4) É possível acabar com a desigualdade social no Brasil? Como?

5) Faça outros questionamentos acerca do tema e argumente suas idéias.

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Transferência de renda pelo governo em 2004

Em 2004, 15,6% dos domicílios no país tinham pelo menos um morador recebendo dinheiro de programa social do governo, sendo que na Região Nordeste este percentual chegou a 32%. Nesses domicílios beneficiados, 91% tinham rendimento domiciliar per capita1 de até um salário mínimo e 1,1% de mais de dois salários mínimos. Estas e outras informações fazem parte do suplemento da PNAD de 2004 sobre Acesso a Transferências de Renda de Programas Sociais, que inclui tabelas desagregadas por Grandes Regiões e Unidades da Federação.

Dentre os programas sociais governamentais, das esferas federal, estadual e municipal, encontram-se aqueles que visam dar suporte às famílias das menores faixas de rendimento por meio de transferências em dinheiro. Entre esses programas de transferência de rendimento pesquisados, estavam desde o auxílio-gás, que era de R$ 7,50 mensal, pago bimestralmente, até o Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC-LOAS, que foi fixado em 1 salário mínimo mensal.

Realizada pelo IBGE, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), entrevistou 399 354 pessoas e 139157 unidades domiciliares distribuídas por todo o país.


Em 2004, cerca de oito milhões de domicílios foram beneficiados com programa social de transferência de rendimento do governo



No total de domicílios particulares no país, 15,6% eram constituídos por aqueles em que algum morador recebeu dinheiro de programa social do governo. A Região Nordeste apresentou o maior valor desse indicador (32,0%) e a Sudeste, o mais baixo (7,9%).



Já entre os domicílios no Brasil com rendimento mensal domiciliar per capita de até ¼ do salário mínimo, a proporção de moradias em que algum morador recebeu benefício monetário de programa social do governo chegou a 50,3% e na de mais de 2 salários mínimos situou-se em 0,7%. Essa mesma evolução foi observada em todas as regiões.


Nos domicílios particulares em que algum morador recebeu dinheiro oriundo de programa social do governo, quase 91% tinham rendimento domiciliar per capita de até 1 salário mínimo e 1,1% de mais de 2 salários mínimos. Naqueles domicílios em que nenhum morador recebeu transferência monetária de programa social do governo, a parcela dos sem rendimento ou com rendimento mensal domiciliar per capita de até 1 salário mínimo representou 43,0% e a dos que tinham mais de 2 salários mínimos, 27,2%.
Ainda segundo a pesquisa do IBGE, o rendimento mediano mensal dos domicílios que tinham algum morador recebendo dinheiro de programa social do governo (R$ 458) estava em patamar inferior ao dos que não tinham (R$ 880).
Fonte: IBGE
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Veja aqui o texto completo e os gráficos

Classe média encolheu em 2003

Classe média encolheu no 1º ano de Lula


(Correio Popular - Cidades - 13/11/2004)
De São Paulo



“O Brasil empobreceu violentamente em 2003, o primeiro ano do governo Lula.” A afirmação é do professor do Instituto de Economia da Unicamp, Waldir José de Quadros, que está concluindo uma pesquisa sobre o encolhimento da classe média brasileira nos últimos 20 anos.

Ao comparar a situação da classe média entre 2002 e 2003, o economista constatou uma perda de riqueza muito forte para o período de apenas um ano, só comparável ao que ocorreu no governo Collor, com o confisco dos depósitos e aplicações financeiras. “A situação é quase a mesma.”

Leia aqui o texto na íntegra.
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Percentuais da pesquisa em 2003

Ricos - 0,14% (renda familiar mensal acima de R$ 6,9 mil)
__________________ CLASSE MÉDIA ____(31,29%)__________
Classe média alta – 3,38% (renda familiar acima de R$ 5 mil mensais)
Classe média média – 6,61% (renda familiar entre R$ 2,5 mil e R$ 5 mil mensais)
Classe média baixa – 21,30% (renda familiar de R$ 1 mil a R$ 2,5 mil mensais)
__________________ POBRES__________(68,57%)__________
Massa trabalhadora – 26,66% (renda familiar mensal entre R$ 500 e R$ 1 mil)
Trabalhadores com renda ínfima – 22,11% (renda familiar mensal entre R$ 250 e R$ 500)
Indigentes – 19,80% (renda familiar mensal abaixo de R$ 250)
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Fonte: Waldir José Quadros

Distribuição de renda no Brasil

PESQUISA
Pobre rica classe média


Na massa intermediária está quase metade da renda do país, diz estudo

por Paulo César do Nascimento


Alguém no Brasil que tenha uma renda mensal de pelo menos R$ 2.000,00 pode ser considerado rico? A resposta é sim, de acordo com estudo realizado pelo professor do Instituto de Economia da Unicamp, Rodolfo Hoffmann. Mas os resultados da pesquisa "Distribuição da Renda no Brasil: poucos com muito e muitos com muito pouco" revelam surpresa maior ao demonstrar que pessoas com aquela renda integram o privilegiado grupo dos 10% mais ricos do país, o que não é pouco: trata-se de mais de seis milhões de brasileiros e não – ao contrário do que se imagina – de algumas dezenas de milionários freqüentemente expostos aos refletores e ao glamour da mídia.

Embora o assunto possa parecer esgotado – afinal, ainda que não seja mazela exclusiva do Brasil, é notória a injusta distribuição de renda no país– a análise do professor Hoffmann tem o mérito de abordá-lo de maneira inovadora. A partir de estatísticas recentes e confiáveis, ele apresenta números que não só corroboram a grande desigualdade da distribuição da renda nacional, mas, principalmente, enfatizam de forma clara e atualizada os diferentes níveis de renda da população economicamente ativa.

Para estudar as características da distribuição da renda no Brasil, Hoffmann utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo IBGE em 1998 e que encontrou no país (exceto nas áreas rurais dos Estados de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá, não cobertas pela pesquisa) quase 77 milhões de pessoas economicamente ativas.
Na análise, porém, ele restringiu-se aos cerca de 61,6 milhões de pessoas economicamente ativas com rendimento positivo, já que nada menos que 18,6% do total coberto pela PNAD tinha rendimento igual a zero, ou seja, era constituído de pessoas sem remuneração, incluídos nessa categoria os membros não remunerados das famílias dos pequenos agricultores, onde o resultado do trabalho familiar é declarado como rendimento do chefe. Após fazer uma correção para compensar a subdeclaração, o rendimento médio daquelas 61,6 milhões de pessoas é cerca de R$ 950,00.

Classe média? – Mesmo ponderando que a principal limitação dos dados é, certamente, a subdeclaração das rendas elevadas, Hoffmann chegou a números que, no mínimo, convidam a uma reflexão acerca de critérios e rótulos convencionalmente aplicados para se definir categorias sócio-econômicas no Brasil a partir da renda – utilizados mais pela força do hábito do que propriamente embasados em dados científicos. O contingente populacional que no país se convencionou chamar de classe média, por exemplo, à luz do trabalho do professor da Unicamp está equivocadamente posicionado no cenário da distribuição da renda nacional.

"Analisando-se o rendimento das pessoas economicamente ativas, percebe-se que cada uma das pessoas que estão entre os 10% mais ricos ganham pelo menos R$ 2.000,00. São, portanto, pessoas relativamente ricas para a distribuição da renda no Brasil, mas que costumam se considerar pobres. Quando muito a pessoa admite pertencer à classe média", observa Hoffmann.
"O estudo revela, contudo, que não se pode considerar integrante de uma massa intermediária da população um contingente que se apropria de quase a metade de toda a renda nacional", pondera.

Ignorar a extensão territorial brasileira e as enormes diferenças sócio-econômicas entre as regiões contribui para agravar a falta de idéias corretas sobre a distribuição de renda. "Não se pode esquecer que a região Nordeste, com 29% da população analisada, tem 52% do total de pessoas pobres e 54,6% da insuficiência de renda, e exibe medidas de pobreza cujo valor está próximo do dobro do observado para o país como um todo", salienta Hoffmann.

Contradições - Ele acrescenta que, discutir questões polêmicas como a taxação de riquezas e a redistribuição de renda, sem a percepção de aspectos como os abordados em seu trabalho – e aqui Hoffmann vê uma importante contribuição de seu estudo – leva a sérias contradições.

"Os 10% mais ricos têm cerca de 47,2% da renda total, o que significa que sua renda média é 4,72 vezes maior do que a média geral, ou cerca de R$ 4.500,00. Contudo, pessoas com rendimento dessa ordem de grandeza, quando discutem a cobrança de impostos e afirmam que se deveria aumentar a taxação de riquezas, consideram que ricos são pessoas com rendimento substancialmente superiores aos seus próprios", argumenta. "Contudo, o estudo revela que, na verdade, elas é que teriam de ser taxadas."

Para Hoffmann, taxar somente os 1% mais ricos do país - algo em torno de 600 mil pessoas da população economicamente ativa – com o objetivo de redistribuição da renda resultaria em transferência de uma fração muito pequena da renda total. "Ou seja, se o desejo for, de fato, redistribuir renda, a medida só trará resultados reais se atingir a parcela da população que hoje se considera classe média."

Ele acha válidas, porém insuficientes, para a melhor distribuição, iniciativas como o programa de renda mínima. "É um programa que merece ser ampliado, porque proporciona algum tipo de renda a quem tem muito pouco, além de promover a freqüência das crianças às escolas. Mas a distribuição da renda no Brasil não será alterada com uma única medida. Tem que ser uma preocupação constante e presente em todas as decisões políticas e econômicas."
Desfile de anões - Em seu estudo, Hoffmann faz uma referência a uma consagrada passagem do livro Income distribution: facts, theories, policies do economista holandês Jan Pen, em que ele, para descrever a distribuição de renda na Inglaterra, imaginou um desfile de pessoas ordenadas conforme valores crescentes da renda e admitiu que, num passe de mágica, as pessoas ficassem com altura proporcional à sua renda, de maneira que a altura média correspondesse à pessoa com renda média.


Hoffmann emprestou a idéia de seu colega europeu e imaginou um desfile semelhante, com uma grande amostra de pessoas representando a distribuição da renda na população economicamente ativa brasileira, admitindo que todo o desfile, do mais pobre ao mais rico, iria durar 100 minutos.

Nesse exemplo, ao final de 10 minutos de desfile, estaria passando uma pessoa com altura incrivelmente baixa. Ao final de 25 minutos ainda estariam passando pessoas com altura igual a um quarto da média. No meio do desfile, isto é, após 50 minutos, estariam passando anões com altura igual à metade da média. Só quando já tivessem passado três quartos do desfile é que seriam observadas pessoas com altura média, representando a renda média.

No início dos últimos dez minutos desfilariam gigantes com altura igual a 2,1 vezes a média. No início do último minuto passaria uma pessoa com altura maior do que oito vezes a altura média. De acordo com dados da PNAD estudada, o desfile terminaria com uma pessoa cuja altura seria 122 vezes a média.

"Devido à forte assimetria positiva da distribuição de renda, há muito mais pessoas com renda abaixo da média do que acima da média", esclarece Hoffmann. Assim, quem assiste ao desfile imaginado por Pen vê, durante a maior parte do tempo, a passagem de anões. Por isso, Pen afirmou que essa é uma parada de anões, e apenas alguns gigantes.
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Fonte: Jornal da Unicamp - Maio de 2000

30.10.06

Refletindo sobre eleições - Lula e Alckimin

Verifique aqui o placar das eleições para Presidente do Brasil no segundo turno (2006), conforme IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).

Faça sua análise crítica sobre o resultado eleitoral, considerando o critério IDH. O que isso significa para o país? Por que Lula obteve votação elevada, principalmente, nos estados considerados com menor índice de qualidade de vida?

De acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), no segundo turno das eleições, o candidato Alckmin venceu nos estados MS, MT, PR, RR, RS, SC e SP. Embora o DF e RJ estejam entre os cinco melhores índices de IDH, Lula obteve melhor votação em ambos. Já o Amazonas e Maranhão foram os locais com os piores percentuais para Alckmin. O que pode se refletir a partir desses dados?
Veja aqui a comparação, por estados, do primeiro para o segundo turno.
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Posição dos Estados e do DF em relação ao IDH*
(do mais elevado para o pior índice)

1. Distrito Federal
2. Santa Catarina
3. São Paulo
4. Rio Grande do Sul
5. Rio de Janeiro
6. Paraná
7. Mato Grosso do Sul
8. Goiás
9. Mato Grosso
10. Minas Gerais
11. Espírito Santo
12. Amapá
13. Roraima
14. Rondônia
15. Pará
16. Amazonas
17. Tocantins
18. Pernambuco
19. Rio Grande do Norte
20. Ceará
21. Acre
22. Bahia
23. Sergipe
24. Paraíba
25. Piauí
26. Alagoas
27. Maranhão

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* IDH = Índice de Desenvolvimento Humano.

O IDH é o Índice de Desenvolvimento Humano, medido pelas Nações Unidas. O índice indica a qualidade de vida.
FONTE: Atlas do Desenvolvimento Humano, Pnud e TSE



25.10.06

Liberdade de expressão no Brasil?


Brasil 'retrocede' em liberdade de imprensa, diz relatório



"Um editor de um jornal da França foi demitido por publicar charges sobre Maomé em fevereiro de 2006"



Coréia do Norte, Turcomenistão e Eritréia são os países com menos liberdade de imprensa segundo um estudo publicado nesta segunda-feira (22/10/2006) pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF).

Na América Latina, a Bolívia subiu alguns postos e lidera o ranking. Já o Brasil retrocedeu, passando para o 75º lugar.

O relatório afirma que, no Brasil, com um jornalista morto este ano, os ataques à imprensa local continuam sendo "numerosos".

O relatório também aponta Estados Unidos, França, Japão e Dinamarca como países em falta por não terem dado total proteção à liberdade de expressão.

"Infelizmente nada mudou nos países que são os piores predadores da liberdade de imprensa e jornalistas na Coréia do Norte, Eritréia, Turcomenistão, Cuba, Mianmar e China ainda estão arriscando suas vidas ou correndo risco de serem presos por tentar nos manter informados", diz o relatório da organização baseada em Paris.

"Estas situações são extremamente sérias e é urgente que líderes destes países aceitem críticas e parem com as intervenções rotineiras e duras na mídia", afirma o relatório, o quinto deste tipo da organização, chamado Índice Mundial de Liberdade de Imprensa 2006.

América Latina


A Bolívia aparece no 16º lugar do ranking, ao lado de países como Áustria e Canadá.

Fontes da organização RSF afirmaram à agência de notícias EFE que o grande salto da Bolívia pode parecer "surpreendente", mas mostra que não ocorreram ataques diretos nem agressões a jornalistas. Também revelaram que fracassou o objetivo de um parlamentar do partido do presidente Evo Morales de introduzir um projeto de lei de controle da mídia.

O índice da RSF indica que, exceto no caso da Guatemala (90º lugar), a América Central ocupa um posto "de honra". Mas o índice também destaca outras disparidades na América Latina.

Apesar de a Bolívia ter dado um salto e do Panamá ter melhorado muito (39º), Argentina e Brasil sofreram "um claro retrocesso" e agora ocupam os postos 76º e 75º, respectivamente.

Na Argentina, "onde as relações entre a imprensa nacional e a Presidência são execráveis", a retirada de subsídios aos meios de comunicação "não é o único" meio para "atrasar a imprensa", segundo a RSF, pois as suspensões e demissões obedecem a "pressões diretas" de cargos políticos.

Queda

Os Estados Unidos, onde o conceito moderno de liberdade de expressão nasceu e foi difundido, caiu no índice anual da organização do 17° lugar, em 2002, para o 53°, em 2006, em grande parte devido ao deterioramento das relações entre o governo de George W. Bush, o Judiciário Federal e a imprensa, segundo o relatório.

Tensões semelhantes, envolvendo segurança e liberdade de imprensa, ajudam a explicar a queda da França para o 35º lugar, uma queda de 24 lugares em cinco anos.

O crescente nacionalismo no Japão fez com que o país caísse 14 postos, para o 51º.

O relatório traz também algumas boas notícias. O Haiti subiu do 125º lugar para o 87º em dois anos, desde que o ex-presidente Jean-Bertrand Aristide fugiu do país em conflito. Apesar de vários assassinatos de jornalistas permanecerem sem divulgação, a violência contra a imprensa diminuiu, segundo a RSF.

A liberdade de imprensa também melhorou na Bósnia-Herzegovina, em Gana e vários países do Golfo Pérsico.
Alguns países europeus continuam liderando o índice, como Finlândia, Irlanda, Islândia e Holanda, dividindo o primeiro lugar em 2006.

Guerra


Em outras partes do mundo diversos fatores - incluindo guerra, repressão política, preocupações com segurança nacional e crescente nacionalismo - significaram novas ameaças à liberdade de imprensa.


Um exemplo é o Líbano, que caiu do 56º para o 107º lugar nos últimos cinco anos, segundo o relatório, pois a "imprensa do país continua a sofrer com a péssima atmosfera política da região, uma série de ataques com bombas em 2005 e os ataques militares israelenses em 2006".


O relatório também critica a Autoridade Palestina (134º lugar) por não conseguir manter a estabilidade interna, além de fazer críticas a Israel (135º lugar) pelo comportamento, além de suas fronteiras, que "ameaça seriamente a liberdade de expressão no Oriente Médio".


Repressão política no Irã, na Síria e na Arábia Saudita deixaram estes países próximos das últimas colocações no índice.


Os confrontos causados pela publicação das charges mostrando o profeta Maomé também fizeram com que a Dinamarca caísse do topo do ranking em 2005 para o 19º lugar em 2006, devido às ameaças aos autores das charges.


Perturbação, prisão de jornalistas e fechamento de jornais que republicaram as charges levaram a uma queda no ranking de países como Iêmen (149º lugar), Argélia (126º), Jordânia (109º) e Índia (105º).


Alguns dos países que mais desrespeitam a liberdade de imprensa estão na Ásia, onde sete países - entre eles, Mianmar (164º lugar), China (163º) e Coréia do Norte (em último com o 168º posto) - ocupam os últimos lugares do índice.


Na região, os países que mais respeitam a liberdade de imprensa são Nova Zelândia (18º), Coréia do Sul (31º) e Austrália (35º).

Fonte: BBC Brasil.com

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Temas para reflexão:

1) Grande parte dos meios de comunicação está nas mãos de políticos. Uma minoria monopoliza a mídia. Nesse sentido, há informação livre e sem manipulação "interesseira"?

2) Por que rádios comunitárias, universitárias precisam ser piratas pela falta de concessão que fica na mão de poucos?

3) É preciso fazer uma reforma "midiática" com redistribuição das mídias para outros setores? (assim como "reforma agrágria").

4) O que acontece a um país que detem monopólio de informações? Por que o Brasil caiu no ranking da liberdade de expressão?

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13.10.06

Senso crítico X produtividade/progresso X excesso

Texto: Do direito à memoria, de Roberto Massei. Leia aqui na íntegra...


"Entretanto, a concepção de educação, predominante, visa moldá-la exclusivamente para a produção, isto é, age como formadora de mão-de-obra "qualificada". A classe dominante vê a educação e a cultura, portanto, como uma questão de mercado. É possível desenvolver o senso crítico sob o império da filosofia do progresso?" (Roberto Massei)

Excesso de informações

“A modernidade transformou o homem em um ser insensível e sem memória; desproveu-o, inclusive, da capacidade de ter uma preocupação com ela. Na Era da Informação o receptor da comunicação de massa é, na verdade, um ser desmemoriado. Recebe um excesso de informações que saturam sua forma de conhecer o mundo; incham-no, pois não há lenta mastigação e assimilação daquilo que é transmitido pela mídia”. (Roberto Massei)


"O indivíduo deve ser capaz de refletir sobre o escrito, permitido-se fazer uma relação entre o real, o ideal e a fantasia, tirando suas próprias conclusões, criando novos conceitos de ver e sentir a realidade".